sexta-feira, abril 02, 2010

A VIDA E A POESIA DA VIDA

A VIDA E A POESIA DA VIDA
Tenho me questionado se ainda há espaço para a poesia naquele ser que vive uma vida sem encantos. Sabemos que não está nada fácil, para a enorme maioria das pessoas, viver e sobreviver. E como se não bastassem as dificuldades habituais do dia a dia, as horas de transporte desconfortável, os engarrafamentos, a má-vontade do desconhecido em ser gentil nas situações de coexistência forçada, os desafios no ambiente de trabalho, o equilíbrio entre o orçamento doméstico apertado do salário (da maior parte), a dura convivência com a realidade que nos cerca, surge a dificuldade de administrar a própria sensibilidade, tão afetada. Em resumo, as situações estão bem mais intrincadas. Seja aquilo que vemos, presenciamos ou o que nos é apresentado pela mídia em suas opções. E não adianta fugir das notícias, abstendo-se de ler jornais e revistas porque os diálogos que vamos encontrar não falarão de outros assuntos.
Diante do desespero, o equilíbrio entre a realidade nua e crua e o patamar dos sonhos muitas vezes se rompe. Há os que se acomodam na desesperança, encarando o seu destino como imutável, como se estivesse selado, uma figurinha carimbada da dor. Outros enlouquecem de vez e começam a extrapolar em todas as suas vivências, como se o mundo não mais tivesse o amanhã. Muitas opções e comportamentos se alternam: procurar por consolo em qualquer possibilidade de afeto mesmo sabendo que vai doer e sangrar depois, empastelar-se da "fé" vazia no homem que se julga deus, enclausurar-se no individualismo que mata. Transformar-se num crítico ácido e tenaz dos sentimentos!
No entanto e apesar da descrença de muitos existe a POESIA, representada pelas letras, palavras e frases que guiadas pela inspiração e o êxtase da observação atenta constroem outra vida possível, a princípio paralela, mas que com a dedicação e a constância passam a ser o tema da caminhada. Os mais céticos já estarão desistindo de continuar a leitura e classificar-me como piegas. Ledo engano. A conferir.
O que posso dizer a essas pessoas? Simplesmente que não aceitem que alguém mate a sua capacidade de sonhar e expressar os seus desejos e esperanças. Ainda que essa pessoa seja você mesmo, aquele eu localizado lá no interior, ele mesmo, que com certeza já lhe impediu de tentar, de arriscar, de fazer valer a sua existência. O inimigo interno, o mais forte, que trava, que não lhe deixa movimentar-se em nenhuma direção.
Na poesia, a vida é mágica e surpreendente. Amamos e somos amados, vivemos as emoções mais doces e intensas, ou seja, vivemos, sem qualquer compromisso com a realidade! Não diga que estou delirando. Não mesmo. São décadas de experiência na magia das palavras. Nelas tive amores e mais amores, encontros de desejos inesquecíveis. Conheci os homens mais maravilhosos e gentis, os artífices do amor. Em minhas poesias os amores quase nunca me abandonam e quando o fazem logo se arrependem e voltam cheios de saudades. E as feridas, rápidas se cicatrizam. Em algumas ocorreram desilusões, decepções, pois tudo faz parte desse sortilégio em que os enredos correm por nossa conta e escolha. São as necessárias pausas nos desertos que assolam a vida real em determinadas épocas e contra os quais não há antídotos ou fórmula. E isso é tão bom, tão prazeroso que as pessoas que me rodeiam nunca sabem por qual caminho trilha meu coração.
Olhar para o mundo sob as perspectivas mais elaboradas e encantadas que cada poeta nos oferece em suas divagações pelos redemoinhos de suas mentes e sensações. Uma delícia. Lemos construções de enredos que nos enlevam e elevam. Quantas vezes alguém ao "poetar" escreve algo que nos cala, nos emudece, estremece o nosso sentir mais profundo, como se a seta fosse direcionada a nós! E a POESIA é tão extraordinária que mesmo quando retrata a dor, a tristeza, com ela nos identificamos e somos solidários. Desejamos intervir, participar, entrar naquele devaneio. A satisfação estética une-se a um novo vigor que emerge desse jogo gostoso que anima a vida e nos faz mais fortes e revigorados para agarrarmos "os nossos touros" diários à unha! A singeleza e a luta, a eterna dicotomia.
É um convite. Aceite!
Diana Esnero

Sobre os ateus e suas insistências

Sobre os ateus e suas insistências
Posso estar errada, mas sou observadora atenta. Às vezes penso que algumas pessoas fazem a mais absoluta questão de se afirmarem descrentes da existência de Deus e de tudo, a fim de que se sintam livres do compromisso da misericórdia, do desapego ao ego, da solidariedade, do mais difícil exercício mandamental para os que Nele acreditam: amar ao próximo, especialmente aquele que irrita, contraria, se põe como obstáculo em seu caminho, que pensa tão diferente, tem outros valores e opções de vida, se torna seu inimigo, lhe revolta, tenta roubar a sua paz.
Já escrevi que cada um tem sua própria experiência do "grande encontro com Deus" e quem a teve não irá se comover com ironias ou até mesmo injúrias.  Faz parte da vida dos crédulos a tolerância mesmo quando a mesma parece impossível. São provas diárias, nada fáceis. A própria realidade nos testa a cada dia. Mas, assim como entendemos que os ateus têm o direito de o serem assim, por favor, não venham com delírios que ao contrário do que pretendem, só aumentam a nossa Fé!
Diana Esnero
Reproduzo abaixo, um dos melhores artigos que já li, do jornalista Ali Kamel, sobre Deus. Que grande exercício de síntese e reflexão!
DEUS

Ali Kamel - O Globo 27 de novembro de 2007.

Quando soube que o biólogo Richard Dawkins tinha escrito "Deus, um delírio", fiquei intrigado; então um cientista conseguiu a prova de que Deus não existe? Mas, na página 80, acontece o óbvio. Numa gradação de um a sete que vai da crença absoluta na existência de Deus até a certeza absoluta de que Deus não existe, Dawkins admite que está na sexta posição ("tendendo para a sétima"): "Probabilidade muito baixa [de que Deus exista], mas que não chega a ser zero. Ateu de facto. 'Não tenho como saber com certeza, mas acho que Deus é muito improvável e levo minha vida na predisposição de que ele não está lá."
Então por que o delírio do título? Devia ser "quase um delírio" ou "muito provavelmente um delírio".
O que leva um cientista com a reputação de um Dawkins a escrever um livro cuja natureza está fora do âmbito da ciência? Ora, a crença de que "a existência ou a inexistência de Deus é um fato científico sobre o universo, passível de ser descoberto por princípio, se não na prática." Dá para levar a sério? Para Dawkins, dá. Mas, sabedor de que isso não é verdade, ele sai pela tangente. Diz que o fato de que não se pode comprovar a existência de alguma coisa não coloca a existência e a inexistência dela em pé de igualdade: "Mesmo que a existência de Deus jamais seja comprovada ou descartada como certeza, as evidências existentes e o raciocínio podem criar uma estimativa de probabilidade que se afasta dos 50%." De novo, dá pra levar a sério? Dawkins leva.
E se esborracha, às vezes constrangedoramente.
No capítulo 3, por exemplo, o autor se dedica a questionar os clássicos argumentos de São Tomás de Aquino e Santo Anselmo de Canterbury que "provariam" a existência de Deus. O que ele não percebe, porém, é que ao refutar argumentos de que Deus existe não se atinge o objetivo de provar que Deus não existe. É um livro capenga. Fala de Deus, mas afirma que não precisou ler outros teólogos, diz que a vida deve ser estudada pela química, e se desculpa por não ser químico, levanta a hipótese ingênua de que Deus pode ser o equivalente aos amigos imaginários da infância, e se pergunta se a psicologia já testou essa hipótese.
O que mais incomoda é que Dawkins trata o crente mais "sofisticado" como se fosse, em essência, igual aos mais caricatos tele-evangelistas ou aos talibãs ultra-radicais. Para quem não é nem uma coisa nem outra, o livro se torna enfadonho. Dawkins ridiculariza os fundamentalistas porque eles têm uma leitura literal de suas escrituras (se a Bíblia diz que Eva foi feita da costela de Adão, isso é verdade e ponto). Mas, quando ridiculariza as religiões abraãmicas, o que faz Dawkins senão fazer uma leitura unilateral da Bíblia e, a partir dela, criticar o quanto as escrituras são implausíveis e contraditórias? Neste ponto, não há como negar que se trata de um diálogo entre fundamentalistas. Ele nega: "Os teólogos, irritados, protestarão dizendo que não se interpreta mais o livro do Gênesis em termos literais. Mas é exatamente isso que estou dizendo! Escolhemos em que pedacinhos das Escrituras devemos acreditar, e quais pedacinhos descartar, por símbolos ou alegorias." Mas de onde Dawkins tirou a conclusão de que símbolos e alegorias devem ser descartados? Para muitos, acreditar que a história de Adão e Eva é uma alegoria da criação divina do homem não é descartar a crença de que a Humanidade proveio de Deus.
Ao confundir todo crente com os criacionistas, Dawkins passa páginas e páginas tentando provar o que não precisa mais de prova: que a "Teoria da Evolução de Darwin dá conta de como as espécies, entre elas o homem, chegaram a ser o que são. Para muitos que creem, a Evolução não é incompatível com a crença em Deus. Teólogos católicos, por exemplo, afirmam que é plenamente aceitável a possibilidade de que o Criador tenha usado a evolução como um instrumento. A dificuldade não está na Evolução, mas na origem da vida. E esta dificuldade é, até aqui, intransponível.
"A origem da vida só teve de acontecer uma vez. Portanto, podemos permitir que ela tenha sido um evento altamente improvável, muitas ordens de magnitude mais improvável que a maioria das pessoas imagina", admite, sem, porém, qualificar essa probabilidade. Os biólogos fizeram as contas. Para que a vida surgisse na Terra, foi preciso que, ao longo de bilhões de anos, um milhar de enzimas se aproximasse umas das outras, até que ocorresse a única ordenação entre elas capaz de gerar uma célula viva, uma probabilidade da ordem de 10 seguido de mil zeros contra um. Não, não se trata de uma chance em um trilhão, mas de uma chance contra 10 seguido de mil zeros, uma possibilidade praticamente nula.
Para desmerecer esses números, Dawkins cita outros. Pede que nós "suponhamos" que a vida seja algo tão improvável que só aconteça em apenas um entre 1 bilhão de planetas. Ele, então, conclui: como se estima que haja na nossa galáxia entre um bilhão e 30 bilhões de planetas, e como a estimativa é que haja 100 bilhões de galáxias, a vida teria surgido, ainda sim, em um bilhão de planetas. Note o truque: o número de planetas e galáxias é o referendado pela física, mas a afirmação de que a vida só acontece em apenas um entre um bilhão de planetas é apenas uma suposição dele, uma entre muitas. Dawkins esquece de relembrar isso ao leitor e, assim, a vida, mesmo raríssima, ganha um número vistoso, mas, até aqui, fantasioso: a vida existiria em um bilhão de planetas.
No livro, Dawkins, um biólogo a quem sempre admirei, repete quase integralmente conceitos que já apresentou em trabalhos anteriores ("O gene egoísta", "O relojoeiro cego"), em que procurou defender a idéia de que a ciência prescinde de Deus para explicar os fenômenos naturais. Isso é uma coisa. Outra, diversa, é tentar "provar" cientificamente que Deus não existe. O resultado não é ciência, não é teologia, é um somatório de argumentos que não levam a lugar algum.

quinta-feira, abril 01, 2010

Um diálogo primoroso em um livro idem.

Terminei a releitura de um livro excitante: "Vastas Emoções e Pensamentos Imperfeitos" de Rubem Fonseca. Interessante verificar como a releitura, agora, num momento maduro da vida, sem a pressa das épocas passadas de dias de muito trabalho, me fez ver o livro de uma forma totalmente diferente. Foi como se o tivesse visto pela primeira vez. Nessa releitura, sorvi cada parágrafo, as frases que se sucediam, diversas vezes, evocavam idéias e lembranças novas, tudo bem original, diferente da primeira vez que o li, anos atrás. Pude ir e voltar, avançar e retroceder páginas, e soou muito mais prazeroso. Um livro em que o suspense nos prende, os fatos ocorrem velozes, mas há momentos de reflexões e diálogos primorosos. Entre tantos, vou destacar aqui um pequeno trecho de diálogo, travado em um restaurante de nome Aschinger, em Berlim, entre a personagem principal do livro, um cineasta, leitor apaixonado por Isaac Bábel, escritor russo, autor de "A Cavalaria Vermelha" e Veronika, uma alemã bela e culta e também apreciadora de Bábel.
"Aqui", disse Veronika, "Bábel ensinou Canetti a olhar insaciavelmente para as pessoas, a entender as pessoas, sem julgar ou condenar."
"O que é essa tese que você mencionou?"
"Neue Empfindsamkeit? A nova sensibilidade."
A responsabilidade social e política, disse Veronika, não devia excluir a sensibilidade, a reflexão do indivíduo sobre si mesmo. A subjetividade não significava necessariamente um escapismo individualista. O que se buscava era um novo tipo de engajamento social, mais amplo, que não anulasse o indivíduo, não o submetesse a condicionantes sociais e políticas, à desumanização da sociedade e do Estado modernos.


Que grande reflexão, um momento em que parei a leitura para conjeturar, isso se fazia necessário. O prazer da leitura é algo indizível. Quantas vezes, em grandes autores, encontramos subsídios para nossas histórias mais particulares? Escrever, quase uma missão, uma seta que percorre e risca um caminho de emoções múltiplas: encantar, despertar, restaurar, encorajar, inspirar!
Diana Esnero

Artesãos da palavra e do sentimento

"O meu mundo não é como o dos outros, quero demais, exijo demais, há em mim uma sede de infinito, uma angústia constante que nem eu mesma compreendo, pois estou longe de ser uma pessimista; sou antes uma exaltada, com uma alma intensa, violenta, atormentada, uma alma que não se sente bem onde está, que tem saudade... sei lá de quê!"

FLORBELA ESPANCA

Rio de Janeiro, Maravilha!

Rio de Janeiro, Maravilha!
O sol se pondo e o Morro Dois Irmãos ao fundo! Beleza!

Meu papel de parede!

Meu papel de parede!